Aqueles que conduzem uma sociedade empresária, sejam eles os sócios ou administradores, devem estar sempre atentos aos sinais de uma crise que possa atingir a sociedade, especialmente em tempos difíceis para a economia nacional.
A crise é, para a sociedade, uma doença e, quanto antes for identificada, mais medidas podem ser tomadas para superá-la e mais eficaz elas tendem a ser.
No entanto, é comum que, em um primeiro momento, a responsabilidade seja atribuída apenas a fatores externos, como a alta dos juros, encarecimento do crédito, aumento do valor do dólar, aumento do valor do barril de petróleo, entre outros. Por outro lado, fatores internos, ainda que eles sejam consequências diretas desses elementos, tendem a ser ignorados, como problemas administrativos, aumento dos custos, problemas na linha de produção etc.
Há também a crença de que, com o tempo, a turbulência externa desaparecerá e, com ela, os problemas internos. Esse pensamento, no entanto, é extremamente prejudicial para um negócio em crise, pois, uma vez instaurada, a crise não se resolve por si só — ela exige ações efetivas por parte do empresário.
Mas é possível identificar os sinais de uma crise ou a empresa simplesmente quebra de uma hora para outra? Sim, é possível perceber os indícios de uma crise, que geralmente incluem: i) piora nos resultados; ii) incerteza quanto à necessidade de caixa no curto prazo; iii) preocupação com o nível de endividamento; iv) necessidade de capitalização constante; v) preocupação de clientes e fornecedores; vi) falta de informações ou dificuldades de obtê-las; vii) quebras injustificadas de contratos; viii) não renovação de linhas de crédito; ix) taxas de juros acima do mercado; e x) mudança no perfil de crédito.
Piora nos resultados
A piora nos resultados é o primeiro sinal concreto de uma crise e um indicativo de que algo não está certo. Mas qual é a causa dessa piora? Trata-se de um fator circunstancial ou de um problema estrutural mais profundo? Cabe ao administrador, ao identificar esse sinal, mapear as razões da queda e buscar soluções para a recuperação do desempenho.
Incerteza quanto à necessidade de caixa no curto prazo
O ditado “Cash is king” (o dinheiro é rei) é amplamente conhecido no mundo empresarial e reforça, de forma inequívoca, a importância da gestão eficiente do caixa. Sem dinheiro, a sociedade não opera, e, se há incerteza sobre sua disponibilidade, a própria continuidade da empresa fica em risco.
A incerteza quanto à necessidade de caixa no curto prazo surge quando são ofertados descontos para que as vendas aumentem, ou quando os recebíveis são frequentemente antecipados. Se o caixa começa a ficar escasso no fim do mês, é hora de apertar os cintos e investigar a situação para parar a sangria do caixa o mais cedo possível.
Necessidade de capitalização constante
Se o dinheiro é rei, a necessidade constante de audiências com o ele, mostra que as coisas não estão bem no reino. Ou seja, se a todo momento é necessário que seja injetado mais dinheiro na atividade empresarial, é porque ela não está rendendo o suficiente.
Preocupação com o nível de endividamento
Dívida bem contraída pode ser positivas para a atividade empresária, pois proporcionam maior flexibilidade na utilização dos lucros, seja para distribuição ou para expansão do negócio, além de oferecerem vantagens tributárias.
No entanto, ao primeiro sinal de que as dívidas estão se tornando um gargalo para a disponibilidade financeira, o sinal de alerta deve ser ligado e as dívidas devem ser revistas e, se possível, renegociadas.
Quebras injustificadas de contratos
O descumprimento eventual de contratos faz parte de qualquer atividade empresarial, afinal, imprevistos acontecem. No entanto, se os contratos começam a não ser cumpridos, sejam com clientes ou com fornecedores, e não há uma justificativa clara para isso, é necessário procurar a causa desses inadimplementos, pois é um sinal claro de que a crise já chegou e deve ser combatida.
Preocupação de clientes e fornecedores
Relações comerciais duradouras, com fornecedores e clientes, são difíceis de construir e acabam gerando uma certa cumplicidade entre os envolvidos. Se os parceiros de longa data estão preocupados com as entregas e os pagamentos, vale a pena investigar as finanças da atividade empresarial, afinal é melhor prevenir do que remediar.
Falta de informações ou dificuldades de obtê-las
Existe uma correlação negativa entre a facilidade e a qualidade das informações obtidas e a saúde financeira de uma sociedade. Na prática, se o empresário para de dar informações sobre contratos, serviços etc., é porque a atividade empresarial está em crise.
Além disso, os rumores decorrentes da crise também dificultam a obtenção e pioram a qualidade da informação. Os funcionários que saem, seja por demissão ou por vontade própria, espalham rumores sobre a situação da sociedade, e isso repercute no mercado em que ela está inserida.
A diminuição da qualidade da informação também se dá pela negação do empresário em relação a sua própria situação, já que isso faz aumentar os rumores sobre a real situação. Por que estão demitindo tantos funcionários? Por que tantos funcionários estão saindo? Por que eles quebraram de uma hora para outra? Até outro dia estava tudo certo… Esses tipos de consideração passam a ser frequentes quando o empresário não se posiciona, e o que deixa os credores mais assustados e menos propensos a renegociar.
Como diz o ditado, quem não deve, não teme. E se a situação financeira do negócio está saudável, não há razão para que seja difícil obter informações claras sobre a empresa.
Não renovação de linhas de crédito, taxas de juros acima do mercado e mudança no perfil de crédito
Esses eventos são um sinal claro de que o empresário se tornou devedor.
Os bancos, em princípio, têm total interesse em conceder linhas de crédito aos empresários. Para as instituições financeiras, é vantajoso, pois geram receita, e para os empresários, reduz o risco em relação ao seu próprio capital. No entanto, se as linhas de créditos são cortadas, é sinal de que o capital envolvido naquela atividade empresarial já não é mais suficiente para mantê-la.
Se as taxas de juros oferecidas são acima do mercado, significa que o risco daquele empréstimo é mais alto, e, para cobrir esse risco, o banco necessita de um retorno melhor.
Isso também vale para o perfil de crédito, pois ele é baseado em relações anteriores do empresário com instituições financeiras. Se os compromissos financeiros não são honrados, o perfil de crédito piora.
Não pagamento de tributos
Talvez o sinal mais comum, e frequentemente, ignorado de que a atividade empresarial está em crise seja a incapacidade de gerar recursos suficientes para o pagamento dos tributos devidos.
Aqui, não se trata da discussão sobre a excessividade de tributos e suas consequências para a empresa. Quem opta por ser empresário sabe, ou deveria saber, de antemão, quais tributos serão devidos. No entanto, por razões que não serão abordadas aqui, quando a crise chega, a primeira fatura que deixa de ser paga é a do Fisco.
Assim, se o atraso ou até mesmo o não pagamento dos tributos se torna frequente, é certo que o empresário está atravessando um momento de crise.
Tão logo o empresário perceba um ou mais desses sinais, deve tomar as medidas necessárias para sanar a crise, pois a dinâmica da negociação com os credores muda de acordo com o andar da crise. Isso significa que o empresário deve estar sempre atento às mudanças do mercado e da economia, local e mundial, para contornar eventuais problemas financeiros antes que eles se agravem.
Quanto mais cedo o empresário começar a negociar, mais controle ela tem sobre a negociação, e quanto mais a crise avança, mais esse controle se transfere aos credores.
Outro ponto importante relativo ao diagnóstico e tratamento precoce da crise é a disponibilidade de ativos para serem ofertados como garantia. Quanto mais a situação se agrava, mais patrimônio é entregue em garantia, ou até mesmo alienado, para tapar os buracos do caixa. Com menos ativos, torna-se cada vez mais difícil recorrer aos bancos para novos empréstimos.
O reconhecimento precoce dos sinais da crise também concede ao empresário mais tempo para estudar e conhecer o perfil de seus credores, o que permite a formulação de propostas mais adequadas ao perfil de cada um deles.
Ou seja, caso haja essa atenção com os fatores internos e externos e o empresário tome as medidas de controle de crise corretas, é possível realizar o que é chamado de early turnaround. Isso permite a negociação com os credores em um cenário mais calmo, com mais tempo e até mesmo mais facilidade, o que, em regra, resulta em melhores condições para o pagamento das dívidas, no que é chamado de ganha-ganha, onde tanto credor quanto devedor saem satisfeitos com o resultado da negociação e tendem a manter a parceria de negócios.
João Pedro Louzada Gonçalves