Por Bruna Dornas Oliveira Martins, Advogada do Nankran e Mourão Sociedade de Advogados – Coordenadora da Área Trabalhista
Cediço é que com o atual cenário da pandemia decorrente do COVID-19, inúmeras empresas tiveram que adaptar suas relações de trabalho, sendo que uma das alterações mais usais trata dos novos contratos de trabalho, na modalidade do “home office”.
A possibilidade do trabalho à distância foi incluída na legislação trabalhista, através da Lei 12.551/2011, que alterou o artigo 6º da CLT, o qual passou a prever que não há distinção “entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado o realizado a distância”.
Além disso, a reforma trabalhista ocorrida com a promulgação da Lei 13.467/2017 disciplinou o teletrabalho, introduzindo os artigos 75-A a 75-E da CLT.
De pronto, observando-se as disposições dos artigos acima citados, é importante ser ressaltado que a modalidade de trabalho deve ser objeto de pactuação escrita entre as partes, isto é, deve ser realizado um contrato prevendo tal modalidade, sendo que a modificação do trabalho presencial para o home office deve ser objeto de aditivo contratual, realizado em consenso entre o empregado e a empresa empregadora.
No que trata dos custos do empregado para o trabalho em home office, dispõe a legislação que os reembolsos de despesas arcadas pelo empregado serão objeto de acordo entre as partes, previstas em contrato (artigo 75-D, da CLT).
Entretanto, o artigo 2º da CLT, dispõe que o risco da atividade econômica é da empregadora, pelo que há julgados no sentido de que os investimentos para o trabalho na modalidade de home office devem ser arcados pela empregadora, por outro lado, há entendimento de que as despesas adicionais de contas de luz, internet, por exemplo, só deverão ser reembolsadas pela empresa em caso da “comprovação da existência de tais despesas adicionais realizada sem estrito benefício do cumprimento do contrato” (TST; AIRR 62141-19.3003.5.10.0011; Relator Ministro Mauricio Godinho delgado; D.J.: 16/04/2010).
Importante frisar que as referidas despesas devem ser pagas pela empresa como ajuda de custos, tendo em vista tratar-se de verba que tem caráter indenizatório, portanto, não integram a remuneração do empregado.
Noutro norte, no que trata do controle de jornada do empregado que trabalha em “home office”, a CLT, em seu artigo 62, inciso III, prevê que não estará sujeito ao controle de jornada, logo, não tem direito ao recebimento de horas extras.
Mas, as empresas sempre devem observar as disposições de normas coletivas a respeito da obrigação do controle de jornada. Além disso, imperioso lembrar que a jurisprudência trabalhista admite a possibilidade do pagamento de horas extras nas hipóteses em que se comprova a possibilidade de controle da jornada, através de um sistema interno da empresa, por exemplo, mas a empresa ignora tal possibilidade apenas com o fim de se furtar ao pagamento de horas suplementares.
No que trata das normas coletivas aplicáveis, cediço é que na justiça do trabalho prevalece o entendimento de que deve ser aplicada a convenção coletiva do local da prestação de serviços.
Entretanto, em casos de empresas que contratam empregados para trabalho tão somente na modalidade do “home office”, permitindo assim que os empregados trabalharem em qualquer lugar do país, o entendimento jurisprudencial atual, apesar de ainda bem discreto, é de que se aplica a convenção coletiva do local onde fica a agência da empresa a qual o funcionário é subordinado.
A atual legislação é omissa quanto a aplicação dos instrumentos coletivos na modalidade de trabalho do “home office”, pelo que o entendimento acima referido se dá em virtude da aplicação, por analogia, do disposto no artigo 651, §1º, da CLT, o qual prevê a competência para julgamento das ações trabalhistas promovidas por empregado “viajante”, o local em que se encontra a filial da empresa onde o empregado se encontra subordinado.
Fato é, não existe uma regra clara sobre o assunto, pelo que deve prevalecer os entendimentos jurisprudenciais que já se manifestaram sobre o tema, os quais existem, inclusive, antes da edição da reforma trabalhista, no sentido de que, deve haver a mitigação do princípio da territorialidade, aplicando-se a competência conforme artigo 651, §1º, da CLT, especialmente quanto a empresa também não possui filiais nos locais da prestação de serviços.
A título de exemplo, destaque-se decisões proferidas pelos Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT1), de Santa Catarina (TRT2) e de Minas Gerais (TRT3), nos processos de n.º 00110005420145010001, 0000023-21.2017.5.12.0056 e 0010933-06.2016.5.03.0182, respectivamente.
Enfim, em que pese a legislação trabalhista ter regulamentado o teletrabalho, a Lei ainda é omissa quanto a determinadas questões das relações de trabalho, o que acaba por gerar insegura jurídica quanto à adoção desse novo modelo de contrato.
Contudo, deve-se ter em mente que a modalidade de contratação para trabalho em “home office” é cada vez mais usual e necessária, o que vai exigir dos operadores do direito atuação conjunta para que, cada vez mais, haja regulamentações sobre todas as implicações legais decorrentes desta modalidade contratual, para assim, reduzir a insegurança jurídica de sua adoção pelas empresas.
Fonte:
BRASIL, Decreto-Lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 1º de maio de 1.943. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em 06 de abril de 2.021.
BRASIL, Lei N.º 12.551, de 15 de dezembro de 2.011. Altera o art. 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, para equiparar os efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos.. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 15 de dezembro de 2.011. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12551.htm. Acesso em 06 de abril de 2.021.
BRASIL, Lei N.º 13.467, de 13 de julho de 2.017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis n º 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 13 de julho de 2.017. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm. Acesso em 06 de abril de 2.021.